01 May 2007

Ainda a repensar Abril

Tenho acompanhado com interesse a «polémica», se assim se pode chamar, sobre o discurso do Presidente da República nas comemorações do 25 de Abril. O artigo do António Barreto, no Público de Domingo, é uma leitura certeira do que se esconde por detrás da aparente vontade de servir Abril e os jovens. Como a secção opinião não pode ser consultada no site do Público, deixo-vos aqui o essencial:

Quem a tem chama-lhe sua
António Barreto

(...) Nestas festas de comemoração da liberdade, Cavaco Silva nada tinha para dizer. Ou nada queria dizer, o que é bem diferente. Assim, para apesar de tudo não fazer figura de corpo presente, fez o que pôde para ser original. Pôs em causa o sentido e a oportunidade das festas oficiais.
O que é estranho: ninguém aceita um convite para um aniversário para, em casa do anfitrião, discorrer melancolicamente sobre a inutilidade da festa. Socorrendo-se de clichés, falou em nome da juventude, a quem aquela cerimónia nada diria. O argumento é antigo. Mas há qualquer coisa que deixa um incómodo. Não faz sentido querer forjar, ou forçar, a partir do Estado, uma festa jovem, civil e cultural. Esta já se faz. Enquanto houver comunistas, socialistas, gente de esquerda em geral, com mais de umas décadas de idade, haverá festa. É, em boa medida, a festa deles.
As direitas nunca festejaram o 25 de Abril, até por causa do que se lhe seguiu.
Quando um dividido deputado do PSD afirma, como é o caso há anos, que "o 25 de Abril é de todos", está ingenuamente a confessar que de facto não é.
As festas são, numa parte, das esquerdas, que aproveitam o dia para arrasar as direitas, o centro, os governos, os liberais e os patrões. Noutra parte, são dos militares que fizeram a "inesquecível jornada" e que deveriam ter, por gratidão, um belo desfile militar a preceito.
A verdade é que, em todo o país, há, nesse dia, milhares de festas, civis ou autárquicas, quase sempre com o mesmo objectivo: dar voz às reivindicações dos trabalhadores, dos sindicatos, das esquerdas e de alguns intelectuais e artistas. A que não faltam churrascos, bailes e cerveja. Deixem-nas viver, enquanto há, porque é bem possível que, dentro de anos, também o 25 de Abril siga o caminho das praias e dos Centros Comerciais. Quanto ao Parlamento, que produza anualmente aqueles discursos geralmente destituídos de inteligência, novidade ou sentido: dali não vem mal ao mundo. Nem bem.

In Público, de 29 de Abril de 2007

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